Propósito importa?

Vou ser honesto com você, Propósito é uma palavra que quando eu escutava sempre associava com algo difícil de definir e até mesmo esotérico. Algo que pertencia aos discursos motivacionais, mas que perdia a importância diante das atividades avassaladoras do dia a dia. É bonito nos livros de história, está por trás das grandes ideias e revoluções, mas aqui, no mundo real, no meu mundo real, não me parecia algo tão importante quanto os pepinos pra resolver e as contas pra pagar. 

Eu estava completamente errado.

A verdade é que eventualmente você tem momentos onde você se pergunta por que você faz o que você faz. Geralmente a gente busca uma palestra motivadora, um livro inspirador, uma conversa com algum amigo pra relembrar aqueles projetos que você amava quando era mais novo. Esses impulsos vêm em ciclos e duram alguns dias até você ser soterrado pelas pressões diárias e esquecer até ficar exausto de novo.

No meu último ciclo eu encontrei a palestra do Simon Sinek, onde ele fala sobre a importância de encontrar o seu porquê. Ele coloca o por que no centro, seguido do como e do o que, no círculo mais externo. Isso é interessante, porque nosso cérebro se organiza de forma similar na relação entre emoção e razão. Desde a minha formação em biologia eu sempre fui fascinado em entender como o cérebro funciona e eu sei que o centro de respostas emocionais (sistema límbico) está localizados mais centralmente no cérebro, enquanto que os pensamentos racionais são formulados mais na periferia, na região que chamamos de neocórtex. As respostas emocionais são mais rápidas que as racionais e são responsáveis pela maioria das decisões que tomamos. Geralmente você já tomou uma decisão e o que seu cérebro faz é formular explicações racionais para apoiá-la.

Ok, mas o que isso tem a ver com você e com o seu trabalho? Tem tudo a ver e vou te mostrar algumas conexões. Já percebeu que muitas vezes as empresas preferem profissionais que entregam o trabalho no prazo, sabem trabalhar em equipe e possuem boa comunicação do que pessoas muito boas tecnicamente, mas que não são confiáveis? Talvez você tenha a crença de que se tiver um portfólio incrível ou se postar projetos legais nas redes sociais os trabalhos vão surgir por si só. Eles não vão, não importa quão bom você seja.

Vamos supor que seu sonho seja trabalhar num estúdio grande, como a Buck. Você acredita que se montar um portfólio incrível eles vão te chamar e que, se não chamarem, é porque você não é bom o suficiente. Eu imagino que a Buck receba muitos portfólios incríveis todos os dias, então o que o seu tem de diferente? Será que o problema é mesmo o portfólio? Você está alinhado com o que eles esperam de uma pessoa que vai trabalhar lá? Já parou pra pesquisar nos sites, nos trabalhos que eles publicam, nas postagens nas redes sociais o porquê deles fazerem o que fazem? Eu te mostro.

“A Buck é uma empresa criativa, global e orientada para o talento. Desde 2004, construímos um lar para os sonhadores, criadores e realizadores mais talentosos do mundo, em uma cultura colaborativa e livre de ego, que gera parceria e ambição criativa.”

“Em nossa essência, existimos para encontrar oportunidades criativas em todos os desafios – não apenas para pensar, mas para fazer – e povoar o mundo de coisas extraordinárias.”

“Boas ideias vêm de todos os lugares”.

Isso está no site da Buck, disponível para quem quiser ler. Esse é o porquê deles e indica que, além de talento, eles estão interessados em boas ideias, independente de onde você esteja. As suas motivações pessoais se alinham com as motivações deles? O Ariel Costa foi chamado pra trabalhar lá só porque ele é um artista tecnicamente foda ou porque, além disso, ele acredita em trazer novas ideias e povoar o mundo de coisas extraordinárias? Não parece que, de alguma forma, o porquê dele se alinhou com o porquê da Buck? Nesse vídeo no canal do Layer você pode ver não só como ele entrou na Buck, mas porque ele saiu. Sim, existe vida após a Buck.

Mesmo que você seja um freelancer e não queira trabalhar em nenhum estúdio, você funciona como uma empresa, então por que você faz o que faz? A maior parte dos profissionais criativos deseja trabalhar com projetos que tenham significado pra eles, mesmo que eles não consigam definir bem esse significado. Eles sentem alguma coisa e mesmo os trabalhos que são “só pra pagar as contas” servem um propósito de poder alcançar aqueles projetos tão desejados. A verdade é que 8 horas (muitas vezes mais) do seu tempo acordado vai ser vivido trabalhando. As 8 que sobram são pra resolver problemas não relacionados ao trabalho, alimentação e cuidados pessoais, estudo e lazer. Metade das horas acordado da sua vida adulta vai ser passada trabalhando e isso não é pouca coisa. 

Por que você acorda de manhã pra estudar ou trabalhar com motion, ilustração ou animação? Por que você vai passar um terço da sua vida fazendo o que você faz? Por que você vai passar a maior parte do seu tempo acordado trabalhando com arte? Não é só pelo dinheiro. Não me leve a mal, dinheiro é muito bom e extremamente importante, mas ele não vai manter você fazendo o que faz, principalmente depois de se estabilizar.

O emocional importa muito, muitas vezes mais do que o próprio planejamento. Quantas vezes você se planejou, se empolgou e depois acabou largando um projeto, mesmo que ele racionalmente fizesse muito sentido? O propósito muitas vezes te carrega quando você está querendo desistir, porque ele é muito maior do que está acontecendo no momento. Quando Martin Luther King falou diante de centenas de milhares de pessoas e deu voz ao movimento de direitos civis, ele fez o discurso do “eu tenho um sonho” e não o discurso do “eu tenho um plano”.

Ótima semana a todos!

Obs: se você estiver interessado em aprender mais sobre emoções e como elas afetam suas decisões, existe um livro muito bom do Daniel Goleman chamado Inteligência Emocional. Lá ele explica de forma bem simples, mas detalhada como as respostas emocionais são ativadas no cérebro, além de fornecer links para vários artigos científicos caso você queira se aprofundar mais.