Nessa semana, o curta-metragem de animação “Tamo Junto”, dirigido por Pedro Conti e produzido pela Flooul Animation, teve sua estreia através do YouTube.
Tamo Junto é um curta-metragem independente de animação. Em dias de medo, dois vizinhos passam a tornar cada momento de interação como grandes preciosidades. O trabalho conta com a voz do rapper Criolo e da atriz Luciana Silveira, e com a participação de Emicida. A trilha sonora é assinada pela Loud+. Durante a produção, o curta foi uma tentativa de cura através da arte.
Como quase todos, o animador Pedro Conti foi fortemente afetado pela pandemia COVID-19 que assolou – e continua a afligir – a comunidade mundial. Ao contrário de muitos que vivem da indústria de animação, no entanto, Pedro Conti mora no Brasil, um país que foi especialmente atingido pelo vírus, ocupando o segundo lugar, depois dos Estados Unidos, em número total de mortes relacionadas ao COVID.
Em Tamo Junto, Pedro Conti usa locais e eventos de sua própria vida para contar uma história simples sobre dois vizinhos que se ajudam durante os dias sombrios da pandemia, criando momentos especiais para aliviar sua solidão e medo. Feito ao longo de cerca de 16 meses entre maio de 2020 e setembro de 2021, o filme 3D / CG oferece um testemunho sincero do poder da bondade, bem como uma peça memorial que evoca as imagens e sons do bairro onde Conti cresceu.
O curta-metragem, com seu roteiro extremamente sensível, esteticamente impecável e cheio de representatividade, merece a nossa atenção.
Confira abaixo a entrevista de Pedro Conti – que trabalha como artista freelancer para clientes como Walt Disney Animation Studios, DreamWorks, Paramount Pictures e Marvel – dada à AWN (Animation World Network) sobre a produção de Tamo Junto:
AWN: O Brasil foi duramente atingido pela COVID. Como você foi afetado pessoalmente?
Conti: COVID afetou a vida de quase todo mundo no Brasil. Perdemos alguns amigos íntimos, incluindo um dos meus melhores amigos com quem cresci. Ele tinha 35 anos e um filho de um ano. A poesia dos créditos foi minha forma de homenageá-lo. Minha esposa e eu acabamos nos mudando para outra cidade do sul do Brasil, pois queríamos um pouco mais de espaço para respirar. Tenho um filho de três anos que exige muita atenção e, em algum momento, sentimos que ele ficou muito afetado por não interagir com outras crianças. Estávamos realmente preocupados com ele durante a maior parte da pandemia.
AWN: O filme foi feito inteiramente durante a pandemia, e como isso afetou o processo de produção?
Conti: Sim, o filme foi feito durante a pandemia. Tivemos muitas pausas, porque eu também estava fazendo um trabalho comercial e às vezes não tinha energia para continuar trabalhando nisso. Mas o filme foi uma forma de ter pequenos momentos doces interagindo com a equipe e trocando ideias – ou apenas conversando sobre a vida. Foi também uma forma de colaborar com artistas que admiro.
AWN: Tamo Junto parece muito autobiográfico. Quanto é realmente baseado em sua experiência pessoal?
Conti: Eu fiz o filme para tentar abordar algumas coisas que eu estava lutando internamente. A pandemia começou alguns meses depois que perdi meu pai de uma forma realmente dramática. Eu estava realmente com medo. Então, a história e esses personagens foram uma forma de eu acreditar que as coisas dariam certo no final. O filme é totalmente baseado em eventos de vida e experiências que tive no passado. Eu também queria usá-lo para compartilhar um pouco da cultura brasileira e transmitir nosso senso de comunidade.
AWN: O “Museu Memória do Jaçanã” aparece várias vezes no filme. Você pode explicar o que é isso?
Conti: Eu cresci no Jaçanã, que é um bairro de baixa renda de São Paulo. Lá havia uma estação de trem que ficou muito famosa quando o cantor e compositor brasileiro Adoniran Barbosa compôs a música “Trem das Onze”, um antigo clássico do samba que se passa no Jaçanã. O museu fica em uma casinha velha, onde guardam algumas peças do trem e fotos de Adoniran. Eu costumava ir lá quando era criança. É o único lugar cultural / histórico da área de que me lembro.
No filme, Dinho, o personagem principal, tem uma foto sua com a mãe no museu, e todos os dias anda pela área para ver as flores e lembrar da mãe. Usei o trem do Jaçanã como símbolo e metáfora para guiar a história.
AWN: Você consegue identificar alguma influência artística ou outra que tenha contribuído para o estilo do filme?
Conti: Acho que hoje estou muito afastado das referências de animação. Embora eu tenha sido influenciado pelos filmes da Disney e da Pixar, estou mais tentando pegar informações brutas de experiências de vida e convertê-las em minha própria arte. Sou mais influenciado pela cultura hip-hop brasileira. Artistas como Racionais MC’s, Emicida, Criolo e tantos outros me impactaram muito no lado da narrativa.
AWN: Qual foi o maior desafio em fazer o filme?
Conti: O filme todo foi um desafio. Por ser um filme independente e de baixo orçamento – além de um projeto paralelo – não pude ter uma equipe trabalhando em tempo integral. Para mantê-lo funcionando e fazê-lo funcionar com toda a equipe foi definitivamente uma grande coisa. Pelo menos 10 vezes, quase desisti. Felizmente, a equipe continuou pressionando para seguir em frente. Então, eu realmente não tenho palavras para expressar o quanto eu aprecio todos os artistas que estiveram envolvidos na produção.
AWN: Idealmente, o que você quer que o espectador tire do filme?
Conti: Não podemos prever como a arte tocará o coração das pessoas. Posso dizer por mim mesmo que o objetivo era tentar acreditar nesse sentido de cuidado e cooperação quando tudo estava quebrado. Não pude reconhecer meu país durante a pandemia. Não quero mudar o mundo, mas queria lembrar os espectadores sobre aqueles pequenos momentos preciosos da vida.
Fonte: Animation World Network – ‘Tamo Junto’: Coming to Terms with COVID Through Art