Quando assistimos a um filme do Laika, ficamos na dúvida se o que estamos vendo é mesmo um objeto real fotografado ou uma imagem CG. A integração com os elementos CG, a pós produção e a ajuda da impressão 3d permitem hoje um Stop Motion quase “perfeito”.
Mas esse Stop Motion ainda é aquela mesma técnica que começou lá nos primórdios do cinema, oficialmente no filme The Humpty Dumpty Circus (1897).
Na década de 1910, alguns filmes franceses também começaram a utilizar o Stop Motion, só que de um jeito um pouquinho diferente: com atores reais e não apenas com objetos. Alguns exemplos clássicos desses filmes são o El hotel eléctrico (1908) de Segundo de Chomón, e o filme “Jobard ne peut pas voir les femmes travailler” (1911) de Émile Cohl.
Mas esse tipo de Stop Motion logo foi abandonado, e o que ganhou força foram os chamados Trick Films, dos quais o cineasta francês Georges Méliès foi o grande precursor. Os Trick Films, aliás, foram os precursores dos efeitos visuais no cinema, como conhecemos hoje. As técnicas utilizadas nesses filmes incluiam a desaceleração e aceleração do filme, truques de edição e vários efeitos na câmera como a múltipla exposição do filme.
Somente em 1951 aquelas primeiras animações com humanos voltaram a acontecer, graças ao animador canadense Norman McLaren. Inspirado justamente nesses primeiros filmes do século XX, sua intenção originalmente era criar um filme experimental para testar animação frame a frame, mas com atores reais.
O filme foi rodado no verão de 1951, com uma equipe pequena: McLaren, Wolf Koenig na camera, e a dupla de animadores Grant Munro e Jean-Paul Ladouceur como atores. Com o título de “Neighbours” (vizinhos), e fazendo uma forte parábola sobre a guerra, o filme recebeu diversos prêmios e até hoje é reconhecido mundialmente.
A técnica utilizada nesse filme ficou então conhecida pelo termo “Pixilation“, nome criado por Grant Munro. O termo se refere à palavra em inglês pixilated que significa “amalucado, bêbado” e que tem ligação com as palavras pixy e pixie, que significam “fada, elfo, duende” (nada a ver com pixel ou pixelation, que é outra coisa!). Seria uma espécie de mágica que anima “coisas” que não foram feitas com a função de serem animadas, de modo muito parecido com os antigos Trick Films do Méliès.
Neighbours, Norman McLaren, National Film Board of Canada
Podemos dizer que o Pixilation é uma variante do Stop Motion, que foi se desenvolvendo como um estilo diferente de outros trabalhos em Stop Motion. A principal diferença é o uso de pessoas reais no lugar de bonecos. O ator se torna um tipo de boneco vivo, utilizando os mesmo princípios da animação para exagerar os movimentos e conseguir situações que seriam impossíveis na vida real. A estranheza dos movimentos não naturais executados por seres e objetos iguais aos de uma filmagem live action é o que constitui a base do Pixilation. O resultado é uma visão surreal da nossa realidade. As leis da física já não se aplicam mais, uma vez que estamos usando animação, mas como o ambiente e os personagens são reais, o filme ganha um tempero a mais.
É uma ótima técnica para se mesclar atores reais e animados, ou imagens live action mais realistas com qualquer tipo de animação. Claro, pode-se também alcançar um efeito parecido se você simplesmente retirar alguns frames de um filme comum — aquele nosso conhecido efeito Posterize no After effects, por exemplo. Mas por não oferecer o controle dos exageros do acting na animação dos personagens e objetos, essa técnica não tem o mesmo requinte de qualidade.
Um dos mais notáveis animadores que utilizam o Pixilation hoje é o PES. Com certeza você conhece o seu curta Fresh Guacamole que combina pixilation com stop motion tradicional e muita genialidade visual.
Outros exemplos recentes excelentes são os curtas “Todor & Petru“, dos franceses do CRCR; e “Golden Oldies” dos holandeses do Frame Order.
O Pixilation não é só encontrado no mundo da animação independente, mas junto com o Stop Motion tem se tornado cada vez mais popular em projetos comerciais e video clipes. Com a tecnologia ajudando cada vez mais (um beijo pro Dragonframe) clipes como esse clássico do Peter Gabriel volta e meia aparecem: White Stripes: Hardest Button to Button, Radiohead: There There, OK Go: End Love, Coldplay: Stawberry Swing e muitos outros … (lembra de mais algum?)
A técnica é uma boa porta de entrada para o mundo do Stop Motion, já que é barata (alguns amigos e uma câmera já são o suficiente!), e uma boa forma rápida pra treinar e aprender os conceitos de animação. O processo é bem divertido, e o resultado final é no mínimo visualmente interessante. Afinal, quem não fica com vontade de também fazer um Pixilation logo depois de assistir a um?
fontes: Cartoon Brew, Wikipedia, ThoughtCo., Marina Kerber, National Film Board of Canada, Deoosanima