Esse texto é uma tradução livre de uma matéria publicada no site The Verge, por
em 5 de Julho de 2017.Até o dia em que Tony Soprano levou seus espectadores numa estranha jornada por uma rodovia de New Jersey pela primeira vez em 1999, as sequências de abertura da televisão eram na maioria das vezes algo simplesmente direto e quase sempre igual.
Começavam com um estabilishing shot: um tubo de onda na costa do Havaí, ou helicópteros carregando veterinários feridos sobre uma montanha na Coréia. Aí uma música tema entrava, e na sua cabeça já ecoava como um jingle publicitário: “essa é uma história de uma senhora adorável…” Alguns nomes apareciam junto com os atores correspondentes, que muitas vezes se viravam e sorriam — ou faziam uma expressão de surpresa, dependendo do seu personagem — de um jeito bem ensaiado. A premissa central já era contada para audiência, sem espaço pra dúvidas. A babá se chama Maria; No sistema de justiça criminal as pessoas são representadas por dois grupos separados, ainda assim igualmente importantes; A verdade “está lá fora”; Aí a família cartoon corria para o sofá e finalmente o programa começava.
As aberturas de Tv montavam o cenário, explicavam algo sobre a história, e aí saiam do caminho. Elas dificilmente eram a atração principal. Mas com Os Sopranos, e dois anos depois com Six Feet Under, algo começou a mudar.
“O que estávamos tentando fazer, ” — diz Paul Matthaeus, o fundador do estúdio Digital Kitchen, que criou a abertura original para Six Feet Under — “era criar um contexto para o programa que fosse instantaneamente mais significativo, mais relevante, e mais penetrativo para a audiência antes mesmo que eles assistissem o frame numero um da série.” Ao invés de simplesmente introduzir a família disfuncional e os atores que vivam cada personagem, a abertura de Six Feet Under utilizava símbolos evocativos para canalizar os maiores temas da série: vida e morte, a dependência existencial do corpo. Em 2011 isso foi uma mudança impressionante, radical até. “Muitas pessoas não entendiam isso realmente,” Danny Yount, o diretor da abertura explicou uma vez para a revista Vanity Fair. “Elas achavam isso uma coisa legal e moderna, mas não algo que iria tragar o espectador para esse espaço etéreo e visceral.”
É claro, em retrospecto, a abstração de sonho da abertura parecia quase rudimentar. Os últimos 15 anos tem visto um firme desenvolvimento de sequências que confrontam a audiência de formas cada vez mais sofisticadas. Da violência cotidiana de Dexter ao desespero corporativo de Mad Men, da estranha história pessoal de Transparent à linha de produção que mais parece saída de um pesadelo de Westworld. Comparadas com suas predecessoras utilitárias, essas novas aberturas são filmes de arte enxutos, algo que a showrunner Moira Walley-Beckett descreveu como “experiências autônomas que movem a imaginação”
De fato, agora existem tantas sequências espetaculares que estamos vivendo o que pode-se chamar de um tipo de renascença: Game of Thrones, The Leftovers, Orange Is the New Black. Algumas vinhetas são tão elaboradas que chegam a ofuscar as séries que teoricamente elas emolduram. Por exemplo, Vinyl: a intro provou ser a parte mais estimulante na série inteira.
Essa renascença alcançou seu marco em Março desse ano, quando a Starz lançou a sua abertura alucinógena de American Gods — lançou na verdade um mês antes da estréia da série. Solta do conteúdo original, a abertura, dirigida por Patrick Clair, ganhou vida por conta própria.
Ao mesmo tempo, a forma como consumimos programas de Tv mudou dramaticamente. Serviços de streaming tornaram o “binge watching” popular, e no processo, transformaram a própria natureza dos programas que assistimos. Como James Poniewozik argumentou no The New York Times a alguns anos atrás, programas via streaming agora constituem seu próprio gênero em que diretores podem evitar práticas entediantes como “repetir o piloto’: contar repetitivamente histórias nos primeiros episódios para acomodar quem chega atrasado na série.”
Como resultado, as sequências de abertura podem parecer fora de lugar nesse novo gênero, um vestígio de chatice para aqueles que já estão no quarto episódio seguido numa longa sessão de “binge watching”.
Em resposta a isso, a Netflix começou a implementar um botão ” pular”, que permitia que os espectadores simplesmente pulassem completamente as aberturas, trazendo a televisão serial ainda mais perto de um formato de filme maratona.
Este é um momento de notável contraste, em que as sequências de abertura ao mesmo tempo florescem com grande potencial mas parecem estar em perigo. Esse conflito levanta uma questão interessante: em uma época em que as vinhetas de tv nunca foram tão boas, pra quê, afinal, elas ainda servem?
Se você perguntar para quase qualquer pessoa com conhecimento interno de como uma televisão de prestígio é feita, provavelmente você vai ouvir a história do HBO.
Como o próprio nome sugere “Home Box Office”, o HBO a muito aspira dissolver as fronteiras entre o cinema e o seu sofá. Um jeito de fazer isso tem sido produzir conteúdo de televisão no mesmo nível de qualidade que Hollywood. Outra maneira ainda mais sutil, mas não menos eficaz, tem sido insinuar esse prestígio em sequências de abertura que ecoam trabalhos clássicos de designers como Kyle Cooper (Se7en), Dan Perri (Star Wars), e Saul Bass. Para subir o nível, de fato, o HBO cooptou e criou uma marca registrada de filmes icônicos: aberturas artísticas que desafiam o espectador a pensar mais profundamente na história que se segue.
A razão pela qual o HBO conseguiu criar qualquer uma dessas sequências de abertura foi a tecnologia. “Grande parte da evolução do design de aberturas tem sido diretamente paralelo a evolução da tecnologia usada para criá-las”, explica Lola Landekic, editora chefe do site Art of the Title, que vem analizando aberturas no cinema e na Tv desde 2007. A renascença de hoje é o resultado direto de uma “democratização das ferramentas”.
“Até meados dos anos noventa, montar uma abertura era difícil e dava muito trabalho. Motion graphics pedia ferramentas como a Quantel Paintbox”, diz Landekic. Isso era uma workstation dedicada que operava com uma caneta stylus, e era tão absurdamente cara que somente os melhores e maiores estúdios a tinham. Algo como a recente abertura de Stranger Things, que homenageia as aberturas de Altered States (1980) e The Dead Zone (1983), teria de ser criado digitalmente e então “filmado”, ou transferido para um filme que seria processado para se alcançar o efeito final.” Não existia jeito pra fazer mudanças rapidamente,” diz Michelle Dougherty, diretora criativa por trás da abertura de Stranger Things. “Você teria que filmar, ver o erro, e aí refazer tudo e filmar novamente… e isso ao longo do tempo se torna muito caro.”
Custo significava que os estúdios raramente estavam dispostos a experimentar. Você precisava entrar numa máquina de produção “realmente sabendo o que você queria fazer”, lembra Matthaeus, “e isso significava que você já entrava na produção pensando em coisas que você havia visto antes.” E assim o mesmo-do-mesmo em muitos shows antigos de televisão acontecia. O que já tinha funcionado antes, funcionaria de novo. Repetição era o mesmo que segurança financeira. Inovação era tratada como uma extravagância inalcançável.
A revolução do desktop mudou tudo isso. Ferramentas como o Quantel Paintbox deram lugar ao CoSA After Effects 1.0, e depois à Adobe (que ganhou um processo contra a Quantel, e acabou engolindo o After Effects para se tornar líder na indústria). A chegada de um programa para edição de vídeo e animação em poderosos computadores Mackintoshs foi o que deu força aos estúdios líderes em motion graphics de hoje, incluindo Digital Kitchen, Elastic, e Imaginary Forces. Sem o pulo tecnológico, esses estúdios nem existiriam, e nós poderíamos ainda estar assistindo a textos brancos piscando sobre imagens de arquivo.
“A tecnologia realmente nos libertou de muitas formas”,
diz Doughert. Ela trabalha na Imaginary Forces, onde produziu sequências de abertura para Jessica Jones e Boardwalk Empire, entre outros. O avanço tecnológico permitiu que um certo grau de brincadeira e experimentação fosse introduzido no processo, o que antes poderia ser motivo de demissão de um designer, por ele ter gasto recursos preciosos. Por exemplo, Dougherty criou algumas alternativas antes de chegar na tipografia flutuante final Benguiat em Stranger Things. A sua qualidade é produto do erro e acerto, de testar ideias e jogá-las fora, e até de acender uma luz através de filme Kodalith para ver o resultado (As imperfeições foram então recriadas com o After Effects). “Nós realmente estávamos buscando a sensação de um filme 80s ruim”, Dougherty diz. Mas os “defeitos” da sequência são cuidadosamente controlados, transformando tudo em um verdadeiro trabalho de amor.
Matthaeus compara a forma atual de criar títulos a como o músico Brian Eno cria sua música. Eno enxerga seu estúdio de gravação como um instrumento musical. Com a sofisticação acessível do software digital, o designer comum pode agora tratar seu computador como um instrumento também. Designers de aberturas deixaram de ser técnicos, executando o trabalho com o mínimo de despesas, e se transformaram em artistas capazes de testar coisas novas. “Você pode testar muito rápido”, diz Matthaeus. ” Dá pra ter algo tangível muito cedo. Você pode ver como algo se move já com a música. A cadência do design e da criação não é mais tão linear.”
Em janeiro de 2017, Alan Williams, coordenando uma equipe de cinco ou seis designers no estúdio Imaginary Forces, poduziu a complexa abertura de Anne With an E, versão da Netflix para a história de Anne of Green Gables.
“Eu quase trato isso como ciência forense”, diz Williams sobre seu processo criativo acelerado. “Eu gravo a conversa que temos com os showrunners, e aí ouço várias e várias vezes, e tento entender qual é o ponto central que faz aquela história ser o que ela é.” Williams apresentou dois tratamento originais para Anne With an E: um live-action e um animado. Quando a animação ganhou, ele chamou o artista Brad Kunkle que produziu oito pinturas a óleo no seu estilo tão distinto. Imaginary Forces fotografou as pinturas com câmeras de alta resolução e então elas foram modeladas em renders tridimensionais. Folhas de ouro e prata foram filmadas para capturar o movimento da luz. E tudo isso foi composto para criar uma sequência que, não muito tempo atrás, teria sido impossívelmente cara, independente do tempo de desenvolvimento. Para Alan Williams e sua equipe tudo foi feito em pouco mais de um mês.
A tecnologia tem permitido tanta liberdade aos designers que eles agora vêem seu trabalho como o de storytellers complementares. No caso de Anne Shirley, “você vê o rosto dela ficar vermelho de emoção quando ela vê todas essas coisas diferentes (na abertura), mas na série mesmo, Anne With an E, você nunca verá as coisas da mesma forma que ela vê .”
Williams decidiu que a abertura ofereceria uma oportunidade rara de dar uma espiada na cabeça de Anne, no início de cada episódio. “Essa é uma personagem que vê as coisas com admiração, mágica no mundano. Esse era nosso momento.”
Patrick Clair, que trabalha com o estúdio Elastic, é provavelmente o mestre moderno das sequências de abertura na Tv. Seu trabalho inclui The Man in the High Castle (que lhe rendeu um Emmy em 2016), Daredevil, The Night Manager, Halt and Catch Fire, The Crown, Westworld, e mais recentemente, American Gods. Seu estilo é metafórico e abstrato, combinando símbolos conhecidos — a estátua da liberdade, a águia nazista — em um vórtice escuro. Possui a sensibilidade associativa de um poeta.
Clair começou no jornalismo, ilustrando notícias para um programa de tv australiano chamado Hungry Beast. Em 2011, lhe pediram que desenhasse um infográfico que explicasse a Stuxnet, a misteriosa arma cibernética, possivelmente americana-israelita, que apagou um quinto das centrífugas nucleares Iranianas. O vídeo de Clair “Anatomy of a Computer Virus,” rapidamente se tornou viral e atraiu a atenção da Ubisoft. Como o próprio Clair conta, a Ubisoft julgo que “se ele pode explicar uma situação de guerra real, talvez ele possa explicar uma guerra fictícia.” Clair então foi contratado para aplicar técnicas do jornalismo visual a mundo fictícios. Eventualmente isso o levou até Hollywood.
A visão jornalística para os detalhes continua sendo uma forte característica no trabalho de Clair como motion designer. Em The Man in the High Castle, por exemplo, mapas, legendas, e setas estabelecem como, na realidade alternativa e distópica da série, os Estados Unidos foi dividido em o Grande Reich Nazista e os Estados Japoneses do Pacífico. Já em Westworld, Clair oferece o que um jornalista poderia chamar de “matéria processual”: destrinchando, passo-a-passo, como algo é construído. Nesse caso um hospedeiro andróide que irá popular o cenário amoral de Westworld. De fato, Clair construiu sua carreira traduzindo conceitos complicados em explicações visuais acessíveis e elegantes.
Mas o que torna tudo isso possível, sugere Clair, é uma mudança radical em como consumimos nossa cultura popular. “A internet nos tornou super-visuais”, ele diz. Agora existem novos padrões na representação da experiência humana em forma visual: video, fotos, emoji, GIFs. A cultura visual “não faz mais parte do seu dia a dia”, o teórico Nicholas Mirzoeff uma vez escreveu, ” ela é o seu dia a dia”.
A medida que as pessoas se tornaram mais adeptas a comunicar pensamentos e idéias por figuras e símbolos, talvez sua habilidade de adivinhar gradações mais sutis de significados nas imagens também tenha aumentado.
É o mesmo princípio da alfabetização: quanto mais letrada uma pessoa é, mais difíceis poderão ser os livros que ela vai conseguir digerir. De “O Gato do Chapéu“ até “Ulysses“.
O que tudo isso significa para o design de aberturas na tv? “De repente as pessoas esperam que você faça coisas que são mais abstratas, mais arriscadas, mais audaciosas e visuais no jeito que você desenha sequências para a Tv”, diz Clair.
Em outras palavras, como nossa cultura é hoje dirigida pela internet e tecnologias interativas, as vinhetas de abertura refletem isso oferecendo cada vez mais um bombardeio sofisticado de imagens.” Nossa habilidade, nossa tendência a sermos capazes de processar esse bombardeio,” diz Mattaeus, “eu acredito que de certa forma é uma metáfora para a forma como nossos cérebros estão trabalhando agora”.
É claro que a tecnologia também revolucionou o jeito como nós, espectadores, assistimos os programas de tv. Os serviços de streaming e os dispositivos portáteis significam que assinaturas de tv a cabo e salas de estar não são mais necessárias. Você pode, se quiser (e for um tanto masoquista), assistir de uma vez uma temporada inteira de Game of Thrones enquanto volta do trabalho no metrô.
Como isso tem influenciado o propósito das sequências de abertura é difícil de subestimar. Em um nível elas continuam sendo o que sempre foram: uma lista obrigatória de nomes dando crédito às pessoas envolvidas na produção. Mas para muitos programas que estão competindo em um mercado de altíssima qualidade e que está crescendo num ritmo exponencial, as aberturas agora também estão sendo usadas para gerar intriga — ou como Mattaeus coloca, um sentimento na audiência de “%*#@& eu preciso assistir isso”. Como a capa de um livro, uma abertura forte é usada para seduzir a audiência a escolher um programa no meio de milhares de outros que podem ser vistos em qualquer lugar a qualquer hora.
Clair gosta de usar a analogia de um vácuo. Antes, o espectador chegava em um programa através do espaço regulado de um canal de tv, “e existe um tom e estética naquele canal”, ele diz. ” Agora, você chega completamente vazio.” Como resultado, as aberturas de Clair, e de muitos outros designers contemporâneos, têm por objetivo fazer a transição da realidade do seu dia a dia para a atmosfera daquele programa.
Uma forma de fazer isso é manipulando a emoção, algo já bastante usado e com efeito devastador na indústria da publicidade. Não é por acidente que muitas sequências de abertura inspiram sensações de confusão, medo, melancolia ou nostalgia; apelar para as emoções da audiência ao mesmo tempo a envolve num nível subliminar e a condiciona para o que ela está prestes a assistir. Um exemplo magistral é a abertura de True Detective, que insinua — através da sua sobreposição de refinarias de petróleo, strippers, rodovias e fogo — sensações de ansiedade e anomia. Esse “retrato feito de cenários quebrados”, como Clair descreve esse trabalho, lhe rendeu seu primeiro Emmy em 2014. Hoje já é considerado um clássico do gênero.
A abertura de Clair para American Gods — uma medusa com cabelo de fibra óptica, um Buddha sobre um confeti de drogas, um astronauta crucificado — é uma sequência que diz centenas de coisas ao mesmo tempo, jogando temas e visões de mundo diretamente no seu cérebro. Quando conversei com os showrunners Bryan Fuller (Hannibal), e Michael Green (que co-escreveu Logan e o futuro Blade Runner 2049), ambos pareciam um pouco atordoados com o que Clair havia criado — mas também entusiasmados. ” Nós queriamos que fosse audacioso. Queriamos que tivesse vários pontos de vista”, diz Fuller, e o que Clair e sua equipe conjurou foi “muito inspirador”. Brian Reitzell, que fez a trilha, descreveu essa abertura como “o choque que você precisa pra processar o resto da série”.
Quando a abertura foi divulgada em Março, semanas antes da própria série, pintou uma dica de possibilidades curiosas para o futuro. Será que uma abertura poderia ser tratada como um videoclipe, uma peça artística de marketing feita para inspirar o espectador a comprar um album (ou série)? Será que ela poderia ter uma vida independente da história da série em si — ser um filme curto, por si só?
O próprio Clair é cético quanto a isso: “No fim do dia, a abertura não significa muito sem o drama denso e complexo que vem em seguida”. E a moda por aberturas cada vez mais extravagantes está começando a levantar sobrancelhas em alguns cantos da indústria, também. Will Perkins, um dos editores no Art of the Title, diz ” virou uma espécie de corrida das aberturas. Se todos os programas na televisão tiverem uma sequência de abertura chamativa, o que eles podem fazer para se destacar do resto? Vão ter que continuar com vinhetas cada vez mais elaboradas que as anteriores, só para competir no mesmo nível. Eu acho que isso pode, em algum ponto, encorajar os espectadores a apertar o botão ‘pular créditos”. Na verdade, algumas séries já estão pulando os créditos automaticamente: The Handmaid’s Tale é um dos exemplos mais recentes, que usa nada mais do que uma cartela de título simples e rápida.
Em Março, alguns assinantes do Netflix perceberam uma nova função quando eles davam play em alguma das suas séries preferidas: um botão “pular intro” que permitia pular a abertura. A Netflix informou que “fazemos centenas de testes todos os anos para ajudar a melhorar a experiência dos assinantes”, e que a empresa não havia tomado nenhuma decisão sobre liberar esse botão para todos.
Existe evidência sugerindo que se o Netflix fizesse isso, provavelmente teria de encarar certa resistência da audiência. Em 2016 os produtores por trás de American Horror Story decidiram cair com a famosa abertura da série na sua sexta temporada, talvez pelo fato de que uma sequência cuidadosamente trabalhada entraria em conflito com a estética documental da série, de filmagens encontradas, reencenações e entrevistas “reais”. Essa omissão foi rapidamente percebida e criticada pelos fãs.
“As pessoas estavam furiosas online. ‘Cadê os créditos de abertura? Como assim?!?'”
“Eu tirei printscreen de todas essas pessoas gritando.” lembra Lola Landekic. A decisão gerou postagens , fúria no Reddit, e pelo menos um fan trailer, como se a falta de uma abertura fosse simplesmente frustante demais.
Quando perguntados sobre o novo botão do Netflix, a reação de diferentes designers variou da surpresa irônica a aversão escancarada. (A Netflix não quis comentar essa matéria.) Clair disse que sua equipe estava “dando uma olhada”. Manija Emran, uma designer gráfica e tipógrafa de Los Angeles, descreveu o fato como um passo “extremamente contra-intuitivo” que iria “desvalorizar os programas.” Essa também pareceu ser a opinião de outro artista do Imaginary Forces, que reclamou com colegas que “você não tem um botão para pular as cenas de carro.” Outro colega retrucou que isso seria um incentivo para que se dedique-se mais, produza trabalhos melhores, para que se conquiste um botão “repetir intro”.
Apesar disso tudo, em última análise ninguém pareceu tão preocupado com o ataque secreto do Netflix. A atitude geral é que as vinhetas se tornaram parte integrante da identidade da tv de prestígio, e um ponto muito grande de discussão na internet, para desaparecer inteiramente sem causar o tipo de revolta da audiência que aconteceu com American Horror Story.
Em Abril, a Starz me deu acesso aos quatro primeiros episódios de American Gods. Enquanto eu me preparava pra assistir a saga barroca de Shadow Moon, percebi um detalhe: não havia abertura. (Fuller depois me explicou que ela ainda não havia sido finalizada quando eles fizeram o upload desses episódios no link que me enviou). No lugar de uma abertura atordoante, a série simplesmente começava a desfiar as várias linhas dessa história surrealista. Eu me peguei sentindo falta do trabalho de Clair. A série parecia abrupta e ridícula demais sem a abertura. Eu não entrava no clima (“suspended disbelief”). No fim das contas, acabei pausando entre cada episódio para assistir a abertura no Youtube, pra corrigir esse problema.
Isso me lembrou algo que Alan Williams me disse: ” Você senta no sofá mas tem louça suja pra lavar, ou todo o stress do trabalho, ou qualquer outra coisa acontecendo na sua vida… e esse é o momento, do tipo cortinas levantando e luzes se apagando, que te chama a atenção e avisa que vão te contar uma história. E eu acho que precisamos disso. Precisamos dessa preparação pro escape e nos separar de todos os afazeres da vida, mesmo se isso for somente através do nosso celular, no metro.
Uma vinheta de abertura bem sucedida é a que faz isso. Te tira da realidade e te joga dentro dos olhos do narrador.”
fonte: The Verge