Essa é uma tradução livre do artigo original “Coke Habit” and the importance of authorship, publicado pelo Motionographer em Maio de 2017.
Nota do Motionographer: Trabalhar para si mesmo pode ser muito complicado. Você pode começar com as melhores intenções, mas, como de costume, a vida e os negócios sempre encontram uma maneira de interferir. Às vezes, isso pode acabar com a produção inteira, ou pode mudar o escopo do projeto de modo que seja quase irreconhecível em relação a idéia original. Em nosso mundo comercialmente dirigido, o conceito de “projetos autorais” é importante, e contra todos os constrangimentos logísticos, emocionais e financeiros, esse tipo de trabalho e propriedade são importantes. É algo que todos precisamos manter e nutrir. O crescimento vem em muitas formas e tamanhos; mas não toma apenas a forma de cifras.
Neste artigo especial, Dan Covert e Andre Andreev – da Dress Code -, falam sobre sua constante evolução na interpretação de projetos autorais, e todos os altos e baixos que experimentaram ao produzir o seu recente “Coke Habit”.
Nossa área não é ciência avançada – pretendemos fazer o melhor trabalho possível para as agências e marcas que nos contratam. Dessa forma, todos somos fortalecidos pelo produto final e esperamos que nos contratem novamente. Ensaboe, enxágüe, repita. É como mantemos as luzes acesas e a equipe paga.
Mas nós não estudamos tanto para trabalhar apenas com coisas de outras pessoas. Nós também temos idéias! Nossa educação na CCA (California College of the Arts), mostrou-nos a importância da autoria através de um rigoroso exercício de graduação. Pouco depois de nos formarmos, começamos o Dress Code com a idéia de conciliar nosso tempo entre fazer coisas para clientes e para nós mesmos. Com os clientes as apostas são altas e, compreensivelmente, há momentos de comprometimento criativo. Portanto, sempre que possível, tentamos não comprometer os projetos que são exclusivamente nossos. Nós nunca fizemos muito dinheiro nessa área, mas nem tudo se resume sobre empilhar moedas.
Nossa primeira incursão em criar conteúdo próprio, foi escrever e publicar um livro chamado Never Sleep (2008). Em conjunto com o livro, acabamos fazendo um tour de conferências ao redor do mundo. Nós espiamos por detrás das cortinas do “design life style” que tínhamos aspirado na universidade, e palestramos para milhares de pessoas, jantando ao lado das lendas que tínhamos estudado. Foi incrivelmente divertido, mas não muito gratificante; e decidimos que o mundo do design gráfico não era para nós. Precisávamos de um novo desafio. Sem escrever esse livro, nunca teríamos ganhado essa perspectiva tão cedo em nossas carreiras; perspectiva que nos ajudou a repensar o que nos faz felizes e gradualmente nos moveu a mudar o Dress Code de uma empresa de design, para uma empresa de produção.
Nos apaixonamos por documentários por causa do realismo de suas histórias (assista Tabloid… Não tem como fazer algo parecido), e porque fazer docs parecia simples; você compra uma câmera e segue pessoas que fazem coisas interessantes… Certo?! Mas fazer um documentário atraente é algo diferente. Nossa primeira incursão, Across the Field (2008), foi submetida a 37 festivais de cinema e não entrou em nenhum deles. Nossos sonhos do estrelato caíram por terra, mas, eventualmente, nosso pequeno filme chamou a atenção de um incrível escritor e editor que aproveitou e nos contratou para fazer alguns documentários de sobre lendas de design para a AIGA. Desde então, fizemos mais de cinquenta desses filmes – essa foi nossa escola de cinema, nossas 10 mil horas.
Um desses filmes sobre design, a Font Men, era sobre dois designers lendários – Jonathan Hoefler e Tobias Frere-Jones. Combinamos live action e animação para explicar seu processo de tipografia e tal. O filme foi um sucesso – foi bem em festivais e gerou buzz online! Pela primeira vez, obtivemos a validação de que o que estávamos fazendo no mundo dos docs era credível e isso nos colocava em uma nova direção criativa.
Para manter a sanidade e flexibilizar nossa criatividade, todos os anos fazíamos alguns curtas sobre assuntos que nos chamavam atenção: Ruben’s Elevator, All for a Few Good Waves, The Art of the Black Panthers, The Long Way, Flame, e Farrah GFE. Antes de Font Men, éramos reticentes quanto a misturar Motion Design e live action. E, por necessidade, nossos curtas foram conduzidos em live action. A animação foi utilizada com moderação e unicamente como um elemento explicativo para que pudéssemos reduzir os custos de produção. Mas nosso último curta mereceu algo um pouco diferente…
Nós planejávamos fazer um pequeno documentário completamente animado há anos, mas nunca conseguimos decidir sobre uma história que valesse a pena o esforço e custos assustadores. A semente do Coke Habit, começou com uma história que nosso editor Mike nos contou no set: na 10 ª série, ele começou a beber Coca-Cola, e acabou no escritório de um neurologista. A história era tão única e específica que sentimos que só poderia ser contada através de animação.
O processo começou por entrevistar Mike como se houvesse algum assunto documental, tentando elaborar uma narrativa convincente com o áudio. Nós mal começamos a desenhar idéias visuais, quando surgiu um grande debate interno: essa história era convincente o suficiente para justificar o tempo e as dezenas de milhares de dólares necessários para fazê-la? Nossa equipe editorial sabia que histórias se desenvolviam drasticamente desde o primeiro corte até o final, mas nossa equipe de design e animação não tinha muita fé. Em última análise, como diretores criativos, percebemos que os anos podem passar antes que encontremos a história “perfeita”, então decidimos continuar avançando para tentar terminar o que começamos, mesmo que parte da equipe não concordasse.
À medida que progredimos, continuamos a bater no mesmo muro. Se esse não fosse um trabalho interno, teríamos que pressionar e tentar resgatar a peça com alguma animação doida; Em vez disso, tivemos tempo de deliberar e revisar tudo em poucas semanas. As coisas assumiram nova vida quando Marcin Zeglinski se juntou à empresa e assumiu a liderança do projeto com novos olhos. Ele apontou que o que estávamos visualizando era muito literal para a narrativa. Então, sob a liderança de Marcin, o projeto assumiu nova vida em uma linguagem surrealista de ilustração, com as coisas metaforicamente criadas em um mundo onde visualizávamos adequadamente a luta inerente do hábito de Mike.
Em seguida, nosso talentoso animador principal, Josh Parker, que faria toda a animação frame-a-frame, tornou-se freelancer. Seu substituto, Vincenzo Lodigiani, é um mago da animação, mas não em frame-a-frame; então tivemos parar a repensar nossa abordagem. Ao invés de gastar uma grana preta para criar uma animação frame-a-frame perfeita, usamos isso como um desafio para repensar o estilo do personagem. Imprevistos como esse podem produzir resultados inesperados e sólidos; Desta vez não foi diferente. Por necessidade, a linguagem de animação final é muito mais lenta do que a que começamos, mas isso acentua a luta na história de Mike.
Ainda assim, o projeto era imenso e levou dois anos e meio para terminar. Não poderíamos estar mais orgulhosos da peça final e da nossa equipe – presente e passado -, que trabalharam duro. Nós não sabemos o que vai acontecer depois disso, ou se nos levará a qualquer trabalho comercial, mas esse é o risco que se tem ao não fazer compromissos.
Fonte – Traduzido do original “Coke Habit” and the importance of authorship – by Motionographer